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09/10/2021 às 20:00

Dona Sinhá e os devotos de São Benedito: mais que fé, história

O Entretê conversou com 'vizinhas' do Santo Negro, que veem na Festa de São Benedito a consagração da fé e dos vínculos familiares

Priscila Mendes

Dona Sinhá e os devotos de São Benedito: mais que fé, história

Foto: Priscila Mendes / Entretê

Quantos Beneditos e Beneditas há em Cuiabá por causa dos devotos ao Santo Negro? Dona Sinhá, 84 anos, que viveu boa parte da própria história na Rua São Benedito, foi batizada Benedita Duarte de Souza em homenagem ao protetor da capital mato-grossense.

Desde menina, com oito ou nove anos, ia andando de casa - na rua aos fundos da Igreja de Nossa Senhora do Rosário e Capela de São Benedito, região central de Cuiabá - até a igreja, com o avô, por volta das 4h da madrugada, para ajudar a preparar tudo para a missa das 5h.

O avô materno, com quem moravam, era zelador da igreja, em uma época em que não havia ainda um pároco para organizar tudo. Chegavam antes da missa, abriam, limpavam e, depois, a menina ainda levava as intenções (pedidos) dos devotos ao altar do santo.

Dona Sinhá foi fiel ao protetor de Cuiabá a vida toda e, por seu trabalho, é muito respeitada pela comunidade da paróquia. “Abaixo de Deus, São Benedito é meu pai”, conta. Lá foi batizada e só não se casou na igreja onde cresceu, porque, em 1973, a casa católica passava por reforma.

Ela sempre trabalhou muito na organização da Festa de São Benedito. “Nos três dias de missa de manhã, eu sempre fiquei aqui na igreja escrevendo todas as intenções da missa dos devotos. Eu que mandava para o altar, ajudava no altar”, relembra.

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A devota participou diretamente até a última edição, em 2019. Era coordenadora da bandeira, que - em uma Cuiabá sem pandemia - passava nas casas, no centro da cidade, nas empresas públicas e privadas, abençoando a todos.

À medida em que os anos foram passando, dona Sinhá seguiu como coordenadora da bandeira, mas não fazia mais o percurso. Participava de todos os ritos e rezas, até o grupo liderado pelo Rei da Festa partir no trajeto.

Diante de tamanha dedicação e devoção, dona Sinhá recebera diplomas de agradecimento dos festeiros de São Benedito das edições de 2007, 2011 e 2014, que esbanja com muito orgulho à reportagem do Entretê.

Festas de São Benedito

Quando se pensa em Festa de São Benedito, logo se vem à cabeça missas com milhares de pessoas, várias barracas para o tchá co bolo e para jantares e almoços, mesas e cadeiras tomando a viela que dá acesso à igreja.

Este ano não está sendo assim, em razão das adaptações para atender as medidas de biossegurança. Mas também não foi daquele jeito sempre.

“Antigamente, os festeiros faziam cada um a sua festa individual. Só se reuniam aqui na igreja para as missas, a procissão no domingo e, depois da procissão, tinha a quermesse, leilão… Então, alguns dos convidados ficavam. E outros, não: acompanhavam os festeiros”, lembra dona Sinhá.

Daquela forma, ao fim dos ritos religiosos, cada qual promovia sua festa em um espaço privado, seja nas casas de cada um, seja em clubes como o Clube Feminino e o Dom Bosco.

Em determinado momento, na edição que Edgar Vieira foi rei, ele solicitou que a festa fosse unificada, para dar oportunidade das pessoas pobres participarem. “Ele disse: ‘Vamos fazer uma festa juntos, os que podem junto dos que não podem, todos têm que festar’”, conta. Foi aí que a festa passou a ser feita na rua Barão de Melgaço, na casa de dona Bem Bem.

Vizinha de São Benedito

Neize Antunes Ferraz tem 67 anos e morou a vida toda na rua que dá acesso à Igreja do Rosário e de São Benedito. Antes, ali era conhecida como Rua dos Bandeirantes. Hoje, apenas como Coronel Escolástico. A viela com as casas históricas vizinhas à igreja pode ser identificada também como “praça do Rosário”.

Ela nasceu lá, porque foi lá que o pai dela comprou a casa quando, expedicionário, veio morar em Cuiabá. “Quando ele abriu a janela, ele viu a Igreja de Bom Jesus de Cuiabá e que era vizinho de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito e disse: ‘é aqui que eu vou ficar’”.

Em 1991, precisou passar por uma cirurgia e fizeram promessa por ela que, caso a cirurgia corresse bem, ela seria festeira do ano seguinte. “Eu aceitei, paguei todas as promessas”, diante da ‘graça alcançada’. Infelizmente, todavia, no mesmo ano, a mãe dela partiu para “ficar mais perto de São Benedito” e, sem clima para vivenciar a festividade, mas ciente do compromisso católico, organizou o evento naquele ano.

Como a manifestação religiosa foi emocionalmente associada à perda da mãe, Neize passou a ficar mais recolhida na organização da maior festa católica de Cuiabá: atrás do balcão, primeiro cozinhando, depois vendendo os quitutes. “Eu assumi que ia ser festeira, mas eu não queria participar, eu ia ajudar no que fosse preciso”, relembra.

A vizinha do Santo Negro casou-se com outro vizinho - o Axé, morador da mesma rua, também devoto, que, inclusive, foi rei em 2009. Mas, como prometido, ela seguiu nos bastidores da festa. “Enquanto vida eu tiver, eu vou ajudar”, concluiu.
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