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09/05/2022 às 18:25

Mato Grosso, 274 anos: o que o hino revela sobre a História e a Cultura do Estado?

O escritor e historiador João Carlos Vicente Ferreira fala do vanguardismo de Dom Aquino Corrêa, autor da "Canção Mato-grossense"

Priscila Mendes

Mato Grosso, 274 anos: o que o hino revela sobre a História e a Cultura do Estado?

Foto: Reprodução

“O ouro deu-te renome tão grande / Porém mais, nosso amor te dará!”. Esses são apenas dois dos versos que compõem o Hino de Mato Grosso, poesia de Dom Francisco de Aquino Corrêa e música do maestro Emílio Heine, que já registram dois dos tesouros mato-grossenses, o ouro - razão da colonização - e o povo.

Mato Grosso celebra, neste dia 9 de maio, 274 anos desde que a capitania de Mato Grosso foi criada, através de Carta Régia da Coroa Portuguesa que a separava da Capitania de São Paulo, em 1748, e nomeava o primeiro Capitão-general Antônio Rolim de Moura.

Mas até 8 de abril de 1919, bicentenário de Cuiabá, o Estado não tinha um hino e compor uma canção de valorização foi iniciativa do então presidente de Mato Grosso (sim, o título do governante à época era ‘presidente’) Dom Aquino Corrêa, para fazer emergir nos mato-grossenses um sentimento maior de identidade.

Quem explica ao Entretê o momento histórico e cultural que Mato Grosso vivia em 1919 é o historiador e escritor João Carlos Vicente Ferreira, imortal da Academia Mato-grossense de Letras (AML), ex-presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso e autor de livros como 'Mato Grosso e Seus Municípios' e 'Enciclopédia Ilustrada de Mato Grosso'.

Para João Carlos, Dom Aquino Corrêa, arcebispo de Cuiabá, primeiro mato-grossense a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, fundador da AML, criador do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso, era uma pessoa “iluminada”, porque ele tinha uma “visão universal” do Estado, antes da divisão que criou Mato Grosso do Sul.

Era uma figura muito admirada e, quando foi eleito presidente, em 1918, aos 32 anos, tinha bom trânsito com a então capital brasileira Rio de Janeiro. Também se preocupava com a interiorização do Estado com grande dimensão territorial. “Ele foi o governante que saiu de Cuiabá a cavalo e andava pelos municípios. Ele fez uma viagem de barco até Corumbá e, de lá, viajou o interior do que hoje é o Mato Grosso do Sul”.

Hino e brasão

Até 1918, Mato Grosso - a divisão de Mato Grosso em dois estados ocorreu apenas em 1977 - não tinha hino nem brasão, apenas bandeira. No primeiro ano de governo, Dom Aquino Corrêa já propôs o brasão e, em dia festivo, nas celebrações dos 200 anos da capital Cuiabá, o hino foi apresentado pela primeira vez.

Ainda conforme o professor João Carlos, como é chamado, a proposta de Dom Aquino era despertar nos mato-grossenses o que tinha de diferente, de único. “Ele sabia da necessidade de firmar na cabeça das pessoas a importância da cultura de Mato Grosso”, comentou, acrescentando que esse sentimento, que o próprio entrevistado cunhou como “matogrossismo”, que seria algo correspondente ao nacionalismo ou ao bairrismo - sentimento de pertencimento à sua terra, com entusiasmo, merecia destaque.

O país vivia um momento cultural de se desvencilhar da produção cultural europeia, mais especificamente francesa, para reconhecer o que lhe é próprio, o que é brasileiro - em nível de país - e o que é cultura mato-grossense. Esse caldeirão cultural fervilhante transbordou na Semana de Arte Moderna, em 1922, que o professor vê como um marco, uma ponta de tudo que acontecia no Brasil naqueles anos.

Dom Aquino Corrêa, grande poeta e intelectual, foi além do momento cultural brasileiro e quis valorizar a história de Mato Grosso. Isso, para registrar a trajetória de conquistas do Estado, já que asterras ao ocidente eram de domínio espanhol e o território de Mato Grosso é resultado de guerras e batalhas, a exemplo da Guerra do Paraguai.

Por essas batalhas - e como todo hino - a música é conduzida pelo “gênero marcial” - aquele gênero musical pensado para incentivar os guerreiros. Mas a letra registra a fronteira que o Estado faz com (à época) Bolívia e Paraguai, as "minas faiscantes", as guerras e conquistas, o sol e o calor, os campos e o Pantanal, o gado, a fauna, a flora, os rios, os indígenas, os bandeirantes e muito mais.

Hino ou canção?

Mas o hino não nasceu hino. Nasceu “Canção Mato-grossense”, que até 1983 não havia sido oficializada como o hino de Mato Grosso. A Constituição brasileira de 1946 restabeleceu os símbolos oficiais dos estados, mas Mato Grosso só tinha oficialmente o Brasão de Armas e a Bandeira. A lacuna buscou ser corrigida apenas pelo então governador Júlio Campos que, antes de determinar que a poesia de Dom Aquino fosse registrada como hino, criou uma comissão avaliativa composta por Adauto Alencar, Archimedes Pereira Lima, Marília Beatriz Figueiredo Leite, Lídio Modesto da Silva e Pedro Rocha Jucá.

Isso, porque a Canção Mato-grossense citava os municípios de Dourados e Corumbá, que desde 1977 compõem Mato Grosso do Sul. Mesmo assim, os membros da comissão sugeriram que a composição de Dom Aquino e de maestro Emílio Heine fosse oficializada Hino de Mato Grosso, mantendo-se “inalterável no seu todo ou nas suas partes”, como mencionou professor João Carlos Vicente Ferreira.

Cante junto

Confira o vídeo-clipe foi produzido pelo Sebrae/MT em 2007, com equipe de 270 profissionais mato-grossenses, entre músicos, cantores e técnicos de criação, produção, gravação e direção de vídeo, que buscou enaltecer as belezas naturais e a diversidade cultural do Estado. O Entretê também coloca a letra do Hino na íntegra, para você cantar junto.



Limitando, qual novo colosso,
O ocidente do imenso Brasil,
Eis aqui, sempre em flor. Mato Grosso,
Nosso berço glorioso e gentil!
Eis a terra das minas faiscantes,
Eldorado como outros não há
Que o valor de imortais bandeirantes
Conquistou ao feroz Paiaguás!

Salve, terra de amor, terra do ouro,
Que sonhara Moreira Cabral!
Chova o céu dos seus dons o tesouro
Sobre ti, bela terra natal!

Terra noiva do Sol! Linda terra!
A quem lá, do teu céu todo azul,
Beija, ardente, o astro louro, na serra
E abençoa o Cruzeiro do Sul!
No teu verde planalto escampado,
E nos teus pantanais como o mar,
Vive solto aos milhões, o teu gado,
Em mimosas pastagens sem par!

Hévea fina, erva-mate preciosa,
Palmas mil, são teus ricos florões,
E da fauna e da flora o índio goza,
A opulência em teus virgens sertões.
O diamante sorri nas grupiaras
Dos teus rios que jorram, a flux,
A hulha branca das águas tão claras,
Em cascatas de força e de luz.

Dos teus bravos a glória se expande
De Dourados até Corumbá,
O ouro deu-te renome tão grande
Porém mais, nosso amor te dará!
Ouve, pois, nossas juras solenes
De fazermos em paz e união,
Teu progresso imortal como a fênix
Que ainda timbra o teu nobre brasão.
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