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22/10/2020 às 09:58

Livro de fotografias analógicas revela Festa de São Benedito e cotidiano de Cuiabá

O trabalho do artista visual e arquiteto cuiabano Pedro Thame será lançado neste mês

Entretê

Livro de fotografias analógicas revela Festa de São Benedito e cotidiano de Cuiabá

Foto: Pedro Thame

Cuiabá, a tradicional procissão da festa de São Benedito, seu percurso e o cotidiano que habita os outros 364 dias dos mesmos locais constituem o fio condutor do fotolivro ‘Vacilante’, que o artista visual e arquiteto cuiabano Pedro Thame lança neste mês pelo site www.vacilante.com.br. A cidade e a cultura dos festeiros já vêm capturando o olhar do fotógrafo há pelo menos sete anos.

Pedro começou a fotografar o ensaio que deu origem ao fotolivro “meio que sem saber”, ainda em 2013, quando investigava eventos e festas populares na capital, onde qualquer pessoa pudesse estar, frequentar e vivenciar a cidade, de forma que a observação ocorreria pela perspectiva do pedestre, tendo o caminhar como uma linha condutora.

Na ocasião, Cuiabá estava tomada por obras enormes por conta da Copa do Mundo e, o artista observava tudo que ocorria como quem visitava uma outra cidade, adormecida atrás dos tapumes, no trânsito engarrafado e nos desvios.

“Encontrei a procissão retornando por aquelas ruas que já tinha me acostumado a ver ocupadas pela festa, com barracas, famílias sentadas nas mesas, palco e shows de música. Me deixei ser levado um pouco por aquilo que a Procissão criava e que parecia suprimir tudo ao redor. Não fotografei de imediato, mas aquela experiência ficou guardada em algum lugar em mim”, relata.


Foto de 'Vacilante', por Pedro Thame

No ano seguinte, 2014, Pedro decidiu acompanhar e fotografar a procissão por inteiro. “Pude, então, juntar alguns pedaços do que tinha presenciado e me aprofundar naquela experiência: o caminhar por aquelas ruas, com o grupo grande caminhando lentamente, com a melodia ouvida de dentro do próprio coro, pontuada por silêncios profundos, num fim de tarde que já vira noite perfumada por mirra”, relata.

Pedro então teve a certeza que estava em “outro” lugar. “Não era o centro de Cuiabá que conhecia, a Av. do CPA que transitava no dia-a-dia. A procissão criava algo só dela, um lugar próprio – estar na procissão é estar nela onde quer que esteja. Depois disso, voltei todos os anos. É claro que muita coisa passou a fazer sentido tempos depois”.

Olhar intimista

Assim, o trabalho traz uma proposta intimista desde a captura e revelação das imagens, até a organização da publicação. É que Pedro Thame fotografou com câmera analógica e revelou os filmes de forma caseira – processo que o artista visual considera essencial para o resultado de ‘Vacilante’.

“Revelando meus filmes manualmente em casa, controlo os detalhes para chegar às texturas que busco nas imagens. É um trabalho quase todo manual, só quando não tem mais como, eu passo ao computador. Foi assim com essa e está sendo com a próxima em que estou trabalhando. Gosto de trabalhar com as mãos para pensar uma publicação, é assim que ela será sentida”.

A publicação brinca, explorando um certo jogo de significação e ressignificação das imagens. A maioria das fotos da sequência ocupa uma página toda. Em alguns momentos, surge uma página menor, que deixa ver só uma parte da imagem seguinte. Ao passar a página pequena, o leitor cria recortes e justaposições entre as fotos maiores e menores. Essa diferença cria um contexto que acaba ressignificando cada imagem e o conjunto como um todo.

Pedro também destaca que o fotolivro também tem um tempo diferente; um tempo lento, que permite aos leitores criar outros afetos com as imagens. “Para mim, uma questão importante é o fazer de livros no momento em que nos encontramos. Em especial, livros de fotografias”, destaca o artista.

“Nossa sociedade está em um ritmo alucinante de produção e consumo de imagens. Produzimos, consumimos, descartamos e armazenamos em nuvens imagens a uma velocidade assombrosa. E salvo algumas poucas exceções, nos detemos diante delas apenas o tempo de dar o duplo clique do like da rede social”, complementa.

‘Vacilante’ é financiado pela Lei de Incentivo à Cultura, do Fundo Municipal de Apoio e Estímulo à Cultura de Cuiabá, edital de 2019. Parte da tiragem foi doada para bibliotecas e instituições de acesso público. O fotolivro pode ser adquirido por meio do site oficial da obra e também nas livrarias Janina e custa R$ 25 reais.


Foto de 'Vacilante', por Pedro Thame

Justaposição entre a procissão e o cotidiano

Depois de alguns anos fotografando a procissão, Pedro decidiu utilizar a pesquisa feita para falar de questões da cidade através da fotografia, de forma acadêmica, utilizando o tema para o trabalho final da faculdade de arquitetura e urbanismo.

“Diversas impressões antes apenas sentidas passaram a ser ideias de nomes claros. Como o conceito de lugar, tema central do ensaio, e outras ferramentas de análise do espaço que são muito caras ao ofício de arquiteto. Naquele momento, o foco era o lugar criado pela procissão, a capacidade de alterar drasticamente a paisagem da cidade de maneira temporária e intensa. Refiz diversas vezes o mesmo percurso da procissão em dias comuns, variando horários e sempre caminhando. Assim, o lugar do cotidiano surgiu no ensaio para reforçar o lugar da procissão, explorando essa justaposição”.

Como resultado, o arquiteto realizou uma exposição com o ensaio, que ocorreu no MACP/UFMT durante o 25º SemiEdu, em 2017, com apoio da PROCEV/UFMT.

“Entendo hoje a exposição como um momento desse longo processo que hoje se encerra com a publicação do fotolivro. Depois da exposição, achei que o ensaio poderia caminhar mais, tomar outros rumos. Fui mudando o destaque à procissão e passei a olhar mais para os limites entre a procissão e o cotidiano. Mas afinal, quando acaba um e começa o outro? Essa era a pergunta de fundo. Por mais que a procissão dure algumas horas, ela está presente no cotidiano, pois pertence a um imaginário de um grupo. Um imaginário forte o suficiente a ponto de o evento ocorrer exatamente o mesmo dia há mais de cem anos”.


Pedro Thame por Fred Gustavos

O autor

Pedro Thame tem 27 anos e, como muitos fotógrafos, descobriu a fotografia ainda na infância. Fruto típico da Cuiabá da década de 1990, é filho de pais nascidos em outras cidades, que aqui se encontraram e construíram a família. Arquiteto e urbanista de formação, segue o encanto pelo urbano, pelos elementos que partem da dimensão física para outras áreas do imaginário. Sempre que pode, caminha pelo Centro, sentindo o cheiro de pequi misturado com fumaça de óleo diesel.

Em 2017 expôs Criação do lugar, no MACP/UFMT; e em 2018, autopublicou “O lugar, os lugares”.
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