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31/05/2021 às 08:00

Plebiscito sobre BRT x VLT pode não ter efetividade e desperdiçar dinheiro público

Você sabe o que é plebiscito? Para que serve? Qual sua efetividade? E, principalmente, o custo desta 'eleição'? O Leiagora foi atrás de respostas

Eduarda Fernandes

Plebiscito sobre BRT x VLT pode não ter efetividade e desperdiçar dinheiro público

Foto: Arquivo Pessoal

Nos últimos dias, a palavra plebiscito ganhou as manchetes dos jornais em Cuiabá. Isso porque o município pretende realizar a consulta popular para saber a opinião da população a respeito do modal de transporte que deve ser implantado. No entanto, você sabe o que é? Para que serve? Qual sua efetividade? E, principalmente, o custo desta 'eleição'? O Leiagora foi atrás de respostas e a primeira delas é que pode ser jogado dinheiro fora, uma vez, que um plebiscito não teria força para fazer o Estado mudar a decisão de implantar o corredor de ônibus, o chamado BRT (Bus Rapid Transit). 

O plebiscito pode não render ao prefeito Emanuel Pinheiro (MDB) o efeito desejado. Defensor do Veículo Leve Sobre Trilhos, o emedebista aposta que, caso a população escolha o VLT, sairá vitorioso na batalha política travada com o governador Mauro Mendes (DEM), pois o chefe do Executivo estadual seria obrigado a concluir a obra milionária que “rasga” Cuiabá e Várzea Grande. Não é bem assim.

Para Carlos Perlin, presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-MT, um plebiscito realizado em nível municipal, ainda que envolva duas cidades, não terá poder vinculante sobre o Estado. Ou seja, não será capaz de obrigá-lo a nada. Ainda que a população escolha o VLT, o especialista entende que Mauro tem a prerrogativa financeira e pode, simplesmente, ignorar o resultado.

“Uma discussão que pode ser travada é: até que ponto esse plebiscito é efetivo? Por que se a obra é estadual e o plebiscito é convocado pelo município, seja Cuiabá ou Várzea Grande, o resultado não vincula à autoridade estadual. E aí, se a consulta não valer de nada, por que gastar dinheiro? Qual a justificativa para gastar dinheiro público para algo sem efeito? Poderiam os órgãos de controle vir e falar: ‘tem que anular, tem que suspender”? Poderia. É uma grande chance de que isso aconteça”, alerta em entrevista ao Leiagora.

Diante desse cenário, Perlin explica que a realização do plebiscito pode ser barrada antes mesmo de acontecer. Como a Câmara de Cuiabá fez uma consulta ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) sobre a questão, o primeiro impedimento pode começar neste órgão. Além disso, se provocados, outros órgãos de controle e fiscalização também podem adentrar a discussão e até mesmo judicializar o plebiscito.

“Já o Ministério Público pode entrar com uma ação para suspender o plebiscito se ele entender que alguma regra legal foi violada, não foi cumprida, ou se o valor que vai ser gasto é muito desproporcional à importância do tema”, analisa.
Se não for barrado pelos órgãos de controle e sua pertinência for comprovada, o assunto será colocado nas urnas com uma pergunta objetiva, cuja resposta precisa ser, necessariamente, sim ou não. O que receber mais votos precisa ser cumprido. Acontece que, neste ponto, reside outro fator que pode impedir a votação, pois se o município não tem legitimidade para obrigar o Estado, o plebiscito não tem razão de ocorrer.

“É uma obra estadual, cujos recursos são estaduais, cujo orçamento é do Estado, que é conduzida pela Sinfra, a Secretaria de Infraestrutura do Estado. Enfim, tudo do Estado. E aí não poderia, por exemplo, decidir pela obra que é muito mais cara e jogar essa conta para o Estado pagar. Não faria sentido”, reforça.

Questão judicializada

O presidente da Comissão de Direito Constitucional cita, inclusive, que as decisões judiciais têm dado voz a Mauro Mendes. Em 1º de janeiro deste ano, por exemplo, a desembargadora do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), Helena Maria Bezerra Ramos, decidiu não conceder o Mandado de Segurança solicitado pela Prefeitura de Cuiabá, que buscava impedir que o Governo do Estado troque a obra do VLT pela do BRT (Bus Rapid Transit).

Naquele mesmo mês, no dia 14, o desembargador Mario Kono de Oliveira, também do TJMT, negou pedido de Emanuel para impedir, liminarmente, que o Governo do Estado faça a mudança do modal.

Em ambas as ações, o prefeito alegou ausência da participação das prefeituras da Capital e de Várzea Grande na tomada de decisão. A Justiça já deixou claro que não vê dessa forma e pontuou que os municípios tiveram, sim, acesso aos estudos técnicos de viabilidade da retomada das obras do VLT.

Como trata-se de uma obra estadual, o governador já avisou de forma cristalina: “se o prefeito não quiser e se nós não encontrarmos uma maneira de sobrepor a essa autoridade que ele tem como prefeito da cidade, nós vamos fazer esse investimento em outros municípios”, declarou à imprensa em 21 de janeiro.

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Outra questão pontuada por pelo presidente da Comissão de Direito Constitucional é que, como o modal afeta duas cidades, ambas precisam concordar com o plebiscito. Acontece que, conforme noticiado pelo Leiagora, o prefeito de Várzea Grande, Kalil Baracat, já mudou de ideia com relação ao VLT e acredita que o BRT é mais viável de sair do papel. “O BRT tem reais chances de ficar pronto em dois anos e a um custo de R$ 300 milhões. O VLT, sem prazo e sem valor para ficar pronto. Este é um argumento irrefutável”, analisou.

Ao Leiagora, Perlin pontua que o município pode opinar, mas “não tem legitimidade para interferir de forma decisiva no processo de escolha, cabe isso ao Estado”.

O que é um plebiscito?

Perlin explica que o plebiscito é uma forma de participação direta da população na tomada de decisão sobre um assunto relevante para a sociedade. Necessariamente, a Constituição Federal define esse mecanismo como obrigatório nas questões de divisão territorial e criação de novos municípios. Para além disso, não há uma delimitação dos assuntos que pode tratar.

O plebiscito se difere do referendo popular apenas no tempo em que é feito. Enquanto o primeiro ajuda governantes a tomar uma decisão, o outro é feito em busca de - como o nome já diz - referendar, validar um caminho já tomado.

É o caso do referendo feito em 2005 no Brasil, sobre a proibição da comercialização de armas de fogo e munições. Na ocasião, ele não aprovou o artigo 35 do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003).

Quanto aos prazos, Perlin acredita que, caso o plebiscito seja realizado, seguirá as diretrizes da Constituição Estadual. Após aprovado, a votação deve ocorrer em até três meses.

Emanuel pode pagar pelo plebiscito?

Segundo Carlos Perlin, sim. Isso porque nessa última semana a Câmara de Cuiabá aprovou, em regime de urgência, o Projeto de Decreto Legislativo que prevê a convocação de plebiscito para consultar a população cuiabana sobre qual modal de transporte público deve ser implantado. Diante disso, como é o Executivo quem gerencia o orçamento, Emanuel passou a ter essa autonomia. “Então caberia a ele remanejar o orçamento, se fosse o caso, para fazer frente aos custos que surgem de um plebiscito”.

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Aprovada, na sessão ordinária da terça-feira (25), com 17 votos favoráveis e três contrários, a proposta incluiu na Lei Orgânica Municipal a possibilidade de a Câmara convocar consulta plebiscitária acerca, exclusivamente, da troca do modal.

“Tanto a União, quanto Estados e Municípios podem fazer plebiscito. Não há nenhuma vedação a que nenhum deles o faça, qualquer um deles pode fazer. Inclusive, há essa previsão na Constituição Federal e na Constituição Estadual. Na Lei Orgânica do Município não havia essa previsão, isso foi incluído justamente agora pela Câmara de Vereadores para que houvesse essa autorização para o plebiscito em relação a esse tema, da implantação do modal”, esclarece.

Custo do plebiscito 

O valor ainda não é possível precisar, pois quem deve estipular é o próprio Tribunal Regional Eleitoral (TRE), que foi consultado, mas ainda não se manifestou sobre o assunto. Porém, estima-se que deva ser o mesmo de uma eleição, portanto, algo em torno de R$ 3 milhões a R$ 4 milhões.

Lembrando que ainda deverá ocorrer também uma campanha, que apresentará os argumentos referente aos dois modais para que a população possa ter conhecimento sobre o que irá votar. O que implica em gastos também. E tudo isto, o prefeito está disposto a bancar, já que, segundo ele, democracia não tem preço, só que neste caso, pode também não ter efetividade. 
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