O Governo de Mato Grosso ingressou com um mandado de segurança para derrubar uma decisão do presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), Sérgio Ricardo, que atribuiu para si a relatoria de um procedimento de acompanhamento do programa estadual de concessão de rodovias 2023-2026.
O documento, assinado por cinco pessoas, entre procuradores e subprocurador, afirma que Sérgio Ricardo avocou para si a relatoria do programa de acompanhamento, que antes era relatado pelo conselheiro Valter Albano, de forma que configura “abuso de poder”.
“A decisão desrespeitou claramente o próprio Regimento Interno do Tribunal de Contas, ao criar uma avocação forçada de competência sem autorização, denotando abuso de poder por uma interpretação extensiva que altera a competência naturalmente atribuída ao relator das contas da SINFRA para a análise do caso”, diz trecho do documento.
Segundo o Estado, antes da mudança de relatoria, o acompanhamento do programa estadual de concessão de rodovias se dava de forma regular, até que Sérgio Ricardo atribuiu para si a responsabilidade de fazer a supervisão.
“Todo o feito estava tramitando com impecável regularidade processual e destinado à publicação dos editais do programa de concessão até que, em 10 de setembro de 2024, o Estado de Mato Grosso, ora impetrante, se viu surpreendido pela Decisão nº 393/PRES/SR/2024, atravessada pelo Senhor Presidente do Tribunal de Contas do Estado, Conselheiro Sérgio Ricardo, autoridade aqui apontada como coatora, que avocou a relatoria do Processo nº 180.891-5/2024. A decisão apontou como fundamento o art. 27, XVII, do RITCE-MT e a suposta característica “estrutural do processo”, escreveram os procuradores.
Para transferir a relatoria do programa estadual de concessão de rodovias 2023-2026, Sérgio Ricardo invocou o art. 27 do TCE-MT, que diz que cabe ao presidente “relatar processos de controle externo de alta relevância, a exemplo de auditorias especiais, auditorias coordenadas e levantamentos que envolvam diversas unidades técnicas internas, outros Tribunais de Contas ou entidades de controle do sistema nacional, designando, se for necessário, outro Relator e unidade ou equipe técnica competente para a instrução”.
No entanto, para a Procuradoria Geral do Estado (PGE), a argumentação é falha e se trata de abuso de poder por parte de Ricardo.
“Percebe-se que o dispositivo invocado trata apenas de relatoria propriamente dita, a qual deve ser entendida como relatoria de feitos com distribuição originária, isto é, para processos que são identificados na origem como de ‘alta relevância’ pela Secretaria de Controle Externo. No caso, a decisão de avocação foi relativa a um processo já em andamento desde março deste ano de 2024, distribuído eletronicamente a um julgador prevento. Não houve qualquer reconhecimento, pelo relator natural ou pelo plenário do TCE, da existência de ‘alta relevância’ para o declínio de sua competência para a Presidência da Corte de contas”, argumentaram os procuradores.
Outro lado
Em nota, o TCE-MT se manifestou contra o pedido de mandado de segurança interposto pelo Estado e afirmou ser uma forma de intervenção no órgão, repudiando a ação.
Em consideração aos recentes acontecimentos envolvendo a tentativa de intervenção por parte do Governo do Estado de Mato Grosso na autonomia do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE/MT), a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICON) vem a público manifestar seu veemente repúdio às ações empreendidas pelo Executivo estadual.
A mencionada tentativa, materializada por meio de um mandado de segurança (Proc. 1026160-28.2024.8.11.0000, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo), revela-se como um ato que visa limitar a competência do TCE/MT, especialmente no que tange à avocação de processos classificados como de alta relevância, conforme previsão regimental própria da corte estadual.
Essa ação do Governo de Mato Grosso configura-se como uma afronta à separação dos poderes em um Estado Constitucional, onde o Poder Executivo ignora os limites de suas atribuições e busca concentrar poder de forma abusiva e autoritária.
A ATRICON, como entidade dedicada à defesa das prerrogativas dos membros dos Tribunais de Contas estaduais e ao fortalecimento do sistema de controle externo no Brasil, não tolerará quaisquer práticas que ameacem a autonomia regimental desses tribunais e comprometam a legitimidade de seus atos.
Estamos acompanhando de perto o desenrolar dessa situação e, caso seja necessário, mobilizaremos todos os esforços para levar essa questão às instâncias superiores em Brasília, visando garantir a manutenção da competência e atribuição dos Tribunais de Contas e assegurar o cumprimento de seus objetivos institucionais.
Diante do exposto, expressamos nosso total e irrestrito apoio ao Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso e ao seu Presidente, Excelentíssimo Conselheiro Sergio Ricardo de Almeida, no enfrentamento dessa ação desmedida do Governo do Estado, que ameaça diretamente um direito líquido e certo da corte de avocar questões de extrema relevância.
Confiamos que o TCE/MT utilizará os instrumentos legais ao seu dispor para repelir tais práticas abusivas e proteger seus interesses institucionais de maneira firme e eficaz.