Embora a orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que é insuficiente para a caracterização de suposta fraude no medidor de consumo de energia a prova apurada unilateralmente pela concessionária, quando comprovada a fraude pelos demais meios de prova, a irregularidade administrativa na conduta da concessionária deve ser desconsiderada, sob pena de se premiar a fraude praticada pelo consumidor. Com base nesse ponto de vista, a Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso não acolheu a Apelação Cível 1006069-49.2017.8.11.0003.
O recurso havia sido interposto por uma consumidora em face da Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. Com a decisão do TJMT, fica mantida sentença que julgara improcedente o pedido inicial - ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais - e que também condenara a parte ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, a favor do patrono da parte ré.
Na apelação, a cliente defendeu, sem êxito, que houve abuso de poder por parte da concessionária de energia ao realizar perícia de forma unilateral, culminando com o lançamento da dívida (fatura no valor de R$ 332,76 - referente a consumo não faturado), sem discriminar os critérios usados para tanto. Requereu que fosse declarada a ilegalidade do ato praticado pela empresa e a inexistência do débito, além de condenação em danos morais.
Segundo o relator do recurso, desembargador Sebastião de Barbosa Farias, diferentemente do alegado pela autora, a proprietária do imóvel foi devidamente notificada, não sendo verdadeira a alegação de que o procedimento foi unilateral. “A concessionária emitiu o Termo de Ocorrência e Inspeção 600252, onde foi constatado ‘inversão de fase no boner do medidor’, o que ocasiona o desvio de energia no ramal de entrada, sendo que, por ocasião da inspeção, foi encaminhado, em 28.06.2017, carta ao cliente narrando o apurado, conforme juntado na exordial.”
O magistrado destacou ainda que o histórico de contas demonstra que, totalmente diferente dos demais meses, no mês de abril de 2017 houve o consumo de tão-somente 146 KW, enquanto que nos outros meses a média de consumo da apelante era superior a 300KW. “Embora a apelante alegue irregularidade no procedimento, não apresenta qualquer justificativa para o consumo tão inferior; além disso, houve devidamente oportunizado o ingressar com o procedimento administrativo, não havendo notícia de que tenha apresentado qualquer procedimento à concessionária. Não se pode deixar desapercebido também que se trata de irregularidade externa, sendo passível de fácil constatação”, assinalou.
O desembargador Sebastião de Barbosa Farias afirmou que, embora o termo de irregularidade, por si só, não constitua prova bastante da fraude, visto que se trata de documento produzido de forma unilateral pela apelada, no caso em questão existem outras circunstâncias que reforçam o termo e permitem que se conclua que a adulteração do medidor, de fato, ocorreu. “Também a apelante não requereu a realização de perícia técnica no aparelho, ou a produção de qualquer outra prova. Destaco que a eventual falha na forma da fiscalização não gera para o consumidor o direito de utilizar a energia sem nada pagar (...) Não pode uma irregularidade administrativa ensejar o direito do consumidor se enriquecer sem causa, consumindo energia sem nada pagar”, complementou.
O magistrado também majorou em R$ 800,00 os honorários advocatícios, totalizando-os em R$ 2.800,00.
A decisão foi por unanimidade. Acompanharam voto do relator os desembargadores João Ferreira Filho e Nilza Maria Pôssas de Carvalho.
Da assessoria, Lígia Saito/TJMT