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28/02/2021 às 16:03

Ações questionam competência da Vara da Saúde e Mauro promete guerra às 'máfias da saúde'

Eduarda Fernandes

A competência da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Várzea Grande, para julgar todas as ações relacionadas aos direitos da saúde pública do Estado de Mato Grosso, tem sido alvo de vários questionamentos na Justiça.

Algumas dessas ações já chegaram até ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a retirada da competência e atribuiu essa função às Varas situadas no município onde residem os pacientes. Contudo, essas decisões são isoladas e ainda não têm poder de retirar tal atribuição de Várzea Grande de forma definitiva.

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O que acontece é que a competência dessa Vara foi alterada por meio de uma resolução do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), em 25 de julho de 2019. Desde então, todas as ações relativas aos direitos da saúde passaram a ser decididas por um único juiz, José Luiz Leite Lindote. Antes disso, as questões judiciais de saúde eram decididas por juízes dos próprios municípios onde o paciente residia, ou pelo menos na cidade mais próxima.

O Governo alega que a mudança na competência gerou economia e que antes havia uma “máfia na saúde”, pois os juízes “canetavam” e os hospitais privados aplicavam aos procedimentos valores que bem entendiam, muito acima da tabela.

Em uma coletiva de imprensa concedida em janeiro deste ano, o governador Mauro Mendes (DEM) criticou as decisões do STJ. “Considero um equívoco gigantesco, prejuízo gigantesco e aí eu vou abrir uma guerra gigantesca contra essas máfias que sempre existiram na saúde”, disse.

Mauro prometeu apresentar um estudo detalhado dessa economia nas semanas seguintes, mas até o momento nenhum dado foi divulgado. “Nos próximos dias vamos mostrar o quanto economizamos, porque hoje continua, mas com um juiz sério à frente. O governo, de forma centralizada, consegue antes até do magistrado decidir, atender o pleito, fornecendo o serviço ou medicamento buscado por meio do auxílio”, acrescentou o governador.

Posicionamento da Defensoria

Segundo o defensor público Fábio Barbosa, coordenador do Grupo de Atuação Estratégica em Defesa da Saúde (Gaedic), o posicionamento institucional da Defensoria é contra a centralização das ações na área da saúde numa comarca única, pois isso fere várias legislações. Mesmo concordando que o modelo proporcionou avanços, ele pontua que não é possível sustentar uma situação contrária à lei.

“Por si só, a competência única na área da saúde, no que tange à criação de uma Vara e todos os processos serem caminhados para essa Vara, fere uma série de legislações esparsas. Dentre elas o Estatuto da Criança e do Adolescente, com preceitos constitucionais que rege a competência absoluta para que essas ações que envolvem criança e adolescente tramitarem na comarca da respectiva criança, visando sempre o melhor interesse dessas crianças”, explica em entrevista ao Leiagora.

Fábio reconhece os avanços trazidos pela Vara e admite que se não fosse a questão da legalidade, poderia discutir a manutenção da mesma. “Nós precisamos restabelecer a competência porque não dá pra se manter esse critério ilegal. Não dá pra estruturar alguma coisa em cima de uma ilegalidade”, reforça.

O coordenador destaca, ainda, que restabelecer essa competência das comarcas é um fato primordial que a Defensoria entende necessário. Ao mesmo tempo, ele entende que é possível apresentar um projeto para a criação de uma espécie de central de Justiça da Saúde. “E manter a estrutura, a expertise administrativa dessa Vara”.

Para que a Vara perca a competência exclusiva das ações da saúde é preciso derrubar a resolução. Para isso, cabe à Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (Anadep) acionar o Supremo Tribunal Federal (STF).

“Hoje o que nós temos é já um número muito maior de colegas, de uma semana para cá, que tem me procurado bastante para apresentar modelos de ações nesse sentido. Então um número muito maior de colegas já começa a propor as ações nas suas respectivas comarcas, ou seja, voltando a buscar aquele direito à saúde no município em que o jurisdicionado está próximo ao juiz. Há um número muito maior de ações que já começam a ser interpostas nas respectivas comarcas e não em Várzea Grande”.

Atualmente há 62 recursos ordinários em trâmite no STJ que questionam a competência da 1ª Vara, dos quais 24 já foram julgados, sendo dois em colegiado e 22 monocraticamente.

Tribunal de Justiça

Por meio de assessoria, o Tribunal de Justiça informou que as decisões do STJ valem para os processos individualmente e não extinguem a Vara. “Nesses casos que tem decisão do STJ, os processos estão sendo remetidos para a Vara do domicílio do autor, mas ele tem também a opção de deixar o processo na Vara da Saúde, se quiser”.

A reportagem indagou se o órgão não considera por conta própria descentralizar as ações novamente e não houve resposta.

PGE

Ao Leiagora, a PGE informou que fez uma reclamação constitucional, cujo seguimento foi negado pelo ministro Alexandre de Moraes. Diante deste entendimento do Supremo Tribunal Federal, “a PGE está trabalhando em alternativas jurídicas que preservem os resultados positivos advindos da criação da Vara da Saúde, na Comarca de Várzea Grande”.
 
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