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Artigos / Colunas / Gisele Nascimento

13/10/2022 às 08:15

Exclusão social de pescadores artesanais profissionais

Escrever é uma prestação de serviço relevante, por isso não perca a oportunidade da leitura. Para escrever é preciso ler!

É de conhecimento que vivemos à Era da Tecnologia, internet, mídias sociais, informatização e globalização. E tudo isso ganhou ainda mais repercussão e força após à Pandemia causada pelo Coronavírus, que em virtude do isolamento social, o mundo por muito tempo funcionou na sua modalidade virtual, embora, existisse por trás de cada família, uma realidade nua e crua que assustava a todos, de forma Planetária. Devaneios? Claro que não!

Certo, mas o que isso tem a ver com os pescadores artesanais e exclusão social?  Pois bem! Continue lendo o texto e já vai entender.

Primeiramente, é de conhecimento que existe uma grande divulgação por parte do Governo Federal, em torno da Previdência Social quanto ao MEU INSS em sua plataforma digital. O INSS hoje é quase que 100% digital. Nessa ótica, os pescadores no período da Piracema recebem o seguro-defeso, e esse requerimento é feito virtualmente.

Segundo, no ano passado foi lançado o Recadastramento do Registro Geral da Atividade Pesqueira para todos os profissionais da pesca, seja os pescadores já com carteira, seja para aqueles que trabalhavam com o protocolo provisório, e abriu novas possibilidades para a solicitação de novos registros iniciais de carteira.

O recadastramento, obrigatoriamente, é feito pela plataforma SISRGP 4.0, que é 100% digital, e se não for realizado poderá resultar na suspensão ou cancelamento da licença do pescador do profissional.

Terceiro, nesse contexto, o pescador também tem que efetuar o preenchimento e envio eletrônico dos Relatórios de Exercício da Atividade Pesqueira (REAP) no SisRGP, que semelhantemente é realizado online.

Cabe dizer, que o envio dos relatórios é uma exigência para a manutenção da Licença de Pescador e Pescadora Profissional Artesanal. 

Quarto, com essa reformulação, como é de imposição legal, todo profissional da pesca artesanal, para acessar o seguro-defeso no período da piracema, necessariamente, entre fevereiro e setembro de cada ano precisa pagar a guia do INSS, que agora não é mais feito pela guia da GPS, e sim, pela plataforma do eSocial, que é emitida em conjunto com à Receita Federal do Brasil, na modalidade virtual.

Quinto, para concluir o recadastramento, indispensavelmente, o pescador precisa fazer o seu reconhecimento facial pelo Gov.BR, vez que o seu nível de classificação  dentro do sistema tem que ser Prata ou Ouro, senão ele não consegue concluir em hipótese alguma, o referido serviço.Sexto, com essas plataformas eletrônicas não existem servidores públicos suficientes para atender à demanda nem no INSS, muito menos ainda no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, de forma que os usuários que dependem desses serviços ficam desassistidos de informações tempestivas, claras e precisas, acerca da análise e conclusão dos seus requerimentos.

Sétimo, O Conselho Estadual de Meio Ambiente - CEMA, por meio de seus representantes legais estão desatualizados, e ainda não têm conhecimento de que os pescadores artesanais profissionais, em torno da nova Legislação Pesqueira, PORTARIA SAP/MAPA Nº 265 DE 29 DE JUNHO DE 2021,  que estabeleceu as normas, os critérios e os procedimentos administrativos para inscrição de pessoas físicas no Registro Geral da Atividade Pesqueira, na categoria de Pescador e Pescadora Profissional, e para a concessão da Licença de Pescador e Pescadora Profissional, não precisam mais ser representados por Entidades de Classe como era anteriormente, e assim sendo, se recusam a fornecer as Declarações de Pesca Individual – DPI, tanto para o profissional pescador, pessoalmente, tanto quanto para o seu representante legal, mesmo este estando devidamente constituído, o que configura, sem dúvida, ato arbitrário e ilegal.

E digo isso, por conhecimento de causa, vez que sou profissional do direito previdenciário, representando com isso no ofício da profissão, inúmeros profissionais, que tanto à Plataforma do INSS, SISRPG 4.0, o GOV.BR, quanto o eSocial, não são fáceis de operar e manusear, sem contar, que muitas das vezes esses sítios ficam fora do ar, inviabilizando os requerimentos.

Como é sabido, em torno desses profissionais existem muito “assédio”, no sentido de suprimir direitos, tendo em vista às fraudes que imperam em torno o seguro-defeso. Assim, o Governo tem afunilado cada vez mais os direitos e manutenção desses profissionais em exercício, restringindo e mesmo, negando direitos garantidos constitucionalmente, ao argumento de não preencher os requisitos necessários.

A meu ver, o governo parte do pressuposto de que todo profissional artesanal está fraudando o recebimento de seguro, sem verificar in loco, que existem muitos ribeirinhos com às suas respectivas famílias, que vivem EXCLUSIVAMENTE DA PESCA artesanal. E digo isso, porque tenho visto muitos requerimentos desse benefício ser indeferido, mesmo o profissional preenchendo todas as formalidades obrigatórias.

Fato, é que não tem como negar à tecnologia, porém, em relação aos pescadores que em sua grande maioria são pessoas extremamente simples, muitas analfabetas, que vivem à margem do rio, não tem acesso à internet ou aparelhos eletrônicos que o permitam fazer o recadastramento, a manutenção da carteira, emissão de guia pelo eSocial, requerimento de seguro-defeso, assim como, cumprir as inúmeras exigências lançadas pelo INSS,  quiçá, fazer à biometria facial pelo GOV.BR, de forma que isso, restringe direitos de cunho alimentar.

A pergunta que não quer calar – como é que o profissional vai cumprir com às suas obrigações - se ele sequer tem conhecimento de como deve ser feito?

Sem disponibilizar os meios para efetivação desses serviços, o Governo Federal, gera a maior das exclusões sociais que se possa imaginar, vez que ele parte da premissa de que todos os pescadores, estão amparados pelo acesso à internet e com conhecimento tecnológico adequado, o que posso afirmar, infelizmente, ser uma inverdade.  

Nessa assertiva, o Governo não está preocupado com aquele profissional que verdadeiramente vive da pesca em regime de economia familiar, pois em justificativa de excluir os fraudulentos e fantasmas, que recebem o seguro-defeso indevidamente, acabou por dificultar sobremaneira todos os trabalhadores honestos.

Dessa forma, cabe aos representantes do povo, por meio dos Vereadores, Prefeitos, Deputados, Senadores, etc, se atentarem a essas questões que maculam o princípio da dignidade da pessoa humana, em torno do Estado Democrático de Direito, e levantarem à Bandeira Nacional em prol de efetivar e garantir os direitos desses necessitados como determina à Constituição da República Federativa do Brasil, por meio de projetos, por exemplo, que levem internet gratuita aos pescadores  ribeirinhos e disponibilizem aparelhos de computador, impressoras, cursos, com palestras explicativas e informativas, etc.
É preciso que o Governo Federal forneça os meios, para poder cobrar o resultado, pelo menos no caso desses profissionais carentes.

Gisele Nascimento

Gisele Nascimento
*  é advogada
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