O trecho título de nossa coluna de hoje é extraído de uma versão do finalzinho do versículo 11, do capítulo 9 do livro bíblico de Eclesiastes.

Filosoficamente, ele traz uma máxima interessante: o tempo passa para todos ? para uns parece passar mais depressa que para outros, é verdade, mas passa. Não há como fugir dele. Por mais que tentemos pará-lo, para tentar manter a juventude ou esticar uma época boa; ou que tentemos acelerá-lo, para poder esquecer algo ou deixar definitivamente para trás uma época ruim, o tempo não se dobra a ninguém e, soberanamente, faz seu próprio tempo. Afinal, quanto tempo o tempo tem?

Outro que simplesmente está fora de nosso controle e surge quando bem entende, muitas vezes atrapalhando todo um planejamento tão minuciosa e complexamente estruturado, é o imprevisto. Qualquer plano que façamos está sempre inserido numa espiral que inclui sistemas paralelos, cujo funcionamento raramente depende apenas de nós mesmos. Por vezes, não depende nem está sob o controle de ninguém. Intempéries climáticas estão incluídas nesse grupo. Aquele temporal que alaga a cidade e que pode prender a gente no trânsito por períodos quase intermináveis. O sol ou a temperatura que causam mal-estar. A chuva que ?móia? o churrasco. O vento, que de tão forte prejudica ? ou mesmo impossibilita ? a prática de algum lazer. Uma doença oportunista que nos impede de realizarmos nossas tarefas cotidianas. Hoje mesmo, uma série de imprevistos no trabalho e na vida pessoal fez com que essa crônica do cotidiano, que normalmente chega toda terça pela manhã, somente fosse concluída à noite. Por mais que nos organizemos e que tentemos medir probabilidades e sistematizar ações, há aquilo que subverte toda essa ordem simbólica preestabelecida e simplesmente nos lembra, assim como o poeta português Fernando Pessoa já fez um século atrás, que ?navegar é preciso, viver não é preciso?. Assim, o ato de viver não tem precisão, não segue a lógica de uma ciência exata, em contraste com todos os mapas de navegação. É nesses momentos que o maior dos homens nota que, por mais importante que ele pense que seja, ele ainda está sujeito aos mais elementares movimentos que constituem o emaranhado de forças que agem das mais variadas formas em nossas vidas cotidianas. E assim, todos nós podemos enxergar melhor que tamanho temos perante o que não está sob nosso controle. E isso seria argumento para simplesmente ?deixar a vida me levar, vida leva eu?, como diz a deliciosa letra de Zeca Pagodinho? Veja bem, se calculando, medindo e planejando ainda é possível tudo sair do controle, imagine o que poderia se suceder se simplesmente deixarmos que aspectos fundamentais para a nossa existência sejam delegados ao completo acaso! Essa sensação de controle que sentimos ter sobre o tempo e o imprevisto, e que nos ajuda a construir efeitos de sentido sobre a nossa vida e tudo que a compõe, faz parte do imaginário que nos rodeia e até que nos auxilia a nos mantermos psicologicamente saudáveis. Isso tudo, é claro, além de conseguirmos minimamente organizar o cumprimento de tarefas das quais somos responsáveis, sempre nos sujeitando à implacabilidade do tempo e ? atitude que beira o impossível ? tentando nos desviar ou termos estrutura para suplantar dos imprevistos. Quase impossível, pois a essência do imprevisto mora justamente no fato de que aquilo não foi previsto e, portanto, como nos prevenir de algo que não há como prever? Assim, e com o pedido de desculpas deste autor que vos escreve, chega ao acesso do/a internauta que navega neste veículo o texto semanal desta coluna, com o atraso imposto pelo implacável tempo em conjunto com as surpresas desastrosas que irônicos imprevistos podem causar em nosso cotidiano. Aprendamos a conviver com isso!