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Notícias / Judiciário

02/09/2020 às 18:22

Mãe de Isabele apresenta notícia-crime contra família Cestari, delegado e policiais

Conforme o documento, os denunciados teriam cometido fraude processual, prevaricação e advocacia administrativa, além de outros crimes.

Camilla Zeni e Eduarda Fernandes

Mãe de Isabele apresenta notícia-crime contra família Cestari, delegado e policiais

Foto: Reprodução / TV Cidade Verde

Patrícia Hellen Guimarães Ramos, mãe da adolescente Isabele, que morreu aos 14 anos com um tiro na cabeça, dentro da casa da melhor amiga, denunciou ao Ministério Público cinco membros da família Cestari, o delegado Olímpio da Cunha e outros três policiais envolvidos no caso da menina. 

Conforme o documento, os denunciados teriam cometido fraude processual, prevaricação e advocacia administrativa, além de outros crimes. 

Ao Ministério Público, Patrícia relembrou a morte de Isabele, no dia 12 de julho, e alguns atos que seguiram após o caso. Falou da noite do crime e sobre a presença dos policiais, que não estavam escalados para atender a ocorrência. Apontou a postura do delegado Olímpio, primeiro responsável pelo caso, e situações que considerou terem sido falhas graves durante a apuração.

Fraude processual

Conforme a denúncia, o crime de fraude processual teria sido cometido por Marcelo e Gaby Cestari, os chefes da família, e pelos filhos deles, um menino e a adolescente de 14 anos suspeita de ter atirado contra a amiga. 

O crime, segundo o Código Penal, consiste em tentar induzir o juiz ou perito ao erro ao modificar "o estado de lucar, coisa ou pessoa", durante o processo civil ou administrativo. Em caso de processo penal, as penas, de detenção de três meses a dois anos e aplicação de multa, podem ser dobradas.

De acordo com a família de Isabele, o crime começou quando Marcelo ligou para o socorro e negou que a vítima tinha sido baleada. Depois, segue quando a arma de fogo usada no crime foi retirada do local da morte e quando a adolescente responsável pelo tiro troca de roupa antes da chegada da polícia.

"A análise das condutas de modo isolado pode conduzir à equivocada conclusão
de que se tratou de ações intuitivas, sem consciência e vontade para o cometimento de fraude processual. No entanto, a análise do conjunto probatório revela que as condutas foram concatenadas, sequenciadas, parte de um todo, cuja finalidade era mascarar as circunstâncias da morte da vítima Isabele", diz trecho do documento.


Marcelo Cestari, chefe da família, é acusado de fraude processual

Crime de prevaricação

Essa denúncia é direcionada ao delegado Olímpio da Cunha, que foi o primeiro responsável pelo caso. Segundo o Código Penal, a prevaricação ocorre quando o agente público deixa de praticar, de forma indevida, um ato de ofício, ou quando o pratica de forma contrária ao que diz a lei, apenas para satisfazer interesse pessoal. 

Para a família de Isabele, o delegado foi omisso durante o início das investigações, de forma que beneficiou juridicamente Marcelo Cestari e sua família. 

No documento, que contém 46 páginas ao todo, a denúncia aponta justificativas de Olímpio que demonstrariam "compaixão" com a família Cestari, de forma que ele teria incorrido em indifelidade funcional. A exemplo, citam quando o delegado posicionou que a adolescente não seria ouvida no dia do crime porque "estava abalada".

"Não se atentou a autoridade policial que o suposto abalo emocional da adolescente [NOME] era [e é] absolutamente ínfimo se comparado ao sofrimento da genitora da vítima Isabele. Enfim, preocupou-se, em princípio, apenas e tão somente em agradar emocionalmente à adolescente infratora e olvidouse, por completo, do sofrimento da genitora da vítima. Eis a absurda e lamentável distorção de valores e princípios da Delegacia de Homicídios da Capital", acrescentaram.

A denúncia também cita reunião de Olímpio com policiais civis e militares que apareceram no local do crime, como amigos de Marcelo, bem como com advogado de defesa da família Cestari, sem que a Politec estivesse presente ou membros da família da vítima. O caso foi relatado em depoimento do tenente Luiz Felipe Pedroso da Silva, que atendeu a ocorrência.

Também é questionada a precariedade no isolamento do local do crime, uma vez que diversas pessoas circularam pelo espaço. Ainda, ilegalidade na quantificação da fiança fixada ao empresário Marcelo, pela posse irregular de arma de fogo, e suposta parcialidade por parte do delegado, que teria "solucionado o caso em poucas horas, a partir, exclusivamente, da versão parcial da própria adolescente [NOME], sem realizar uma única diligência".

A família lembra que, na noite do crime, o delegado teria informado à mãe de Isabele que tratava-se de um acidente, e teria reproduzido o discurso passado pela adolescente acusada do crime.

Advocacia Administrativa
Esse crime é relacionado aos policiais civis Leandro Livinali Ecco e Mário José Leite dos Santos, bem como ao policial militar Fernando Raphael Pereira Oliveira. Tal prática consiste em patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário, e pode resultar em pena de detenção de um a três meses, ou multa. Se o interesse for ilegítimo, a detenção pode variar de três meses a um ano, além da multa, prevê o artigo 321 do Código Penal.

De acordo com a denúncia, os indícios produzidos na fase investigativa apontam que os policiais Leandro, Mário e Fernando estiveram presentes na residência da família Cestari na data dos fatos, onde, “valendo-se do cargo público, prestaram auxílio ao particular Marcelo Cestari”.

A presença e participações dos policiais foram demonstradas no depoimento do Tenente Policial Militar Luiz Felipe Pedroso da Silva. Ele relatou que, após chegar a residência foi informado da constatação do óbito de Isabele pelo Samu e determinou o isolamento da parte superior da casa. Pouco depois, “chegaram na residência dois policiais civis que se identificaram como amigos da família”. Um desses policiais civis subiu no quarto de Marcelo Cestari.

Na sequência, chegou ao local o sargento Fernando Rafael, que se identificou como presidente da Confederação de Tiro de Mato Grosso, e após conversar com alguns policiais, também subiu ao piso superior para ajudar Marcelo a apresentar os registros das armas que possui. Inclusive, “o policial civil que subiu no piso superior ajudou no recolhimento do corpo da vítima”.

A chegada dos dois policiais civis também foi relatada no depoimento de Patrícia, que mencionou que “chegou um carro cantando pneu”, de onde “saíram dois indivíduos de dentro do carro e ficaram bastante agitados” e “eram indivíduos bastante prepotentes”.

Leandro Ecco, ao ser inquirido na delegacia, disse que é amigo de Marcelo Cestari desde 2016 e pilotava para o empresário em seu avião particular, um Baron. Ele admitiu ter recebido uma ligação de Cestari na noite do crime, por volta das 22h42, informando-o que “uma menina havia morrido dentro da residência dele em decorrência de um tiro”.

Diante disso, falou que foi até o local por “solidariedade ao momento pelo qual o ‘irmão’ e amigo estava passando” e se identificou portaria como policial civil. Já na residência, se apresentou ao Tenente Pedroso como amigo de Marcelo. Após entrar e sair da casa, se apresentou à equipe da DHPP como delegado.

Depois de terminado o trabalho da perícia no local do crime, assim como recolhido o corpo de Isabele, Leandro ainda se prontificou a presenciar a catalogação das armas de Marcelo Cestari para que fossem apreendidas, uma vez que ninguém da família se prontificou.

“Conclui-se, assim, que, além da ajuda prestada ao particular Marcelo Cestari, confessada no depoimento, mostra-se necessária a instauração de inquérito policial para apurar, por completo, o auxílio prestado pelo policial Leandro Ecco, não somente no interior da residência, mas também perante a Delegacia de Homicídios”, aponta a denúncia apresentada por Patrícia.

Já em relação ao policial civil Mário Santos, que revelou em depoimento também ser amigo de Marcelo há aproximadamente três anos e meio, afirmou ter ido à residência somente para “prestar solidariedade a um momento difícil da família Cestari”. No entanto, foi ao condomínio com uma viatura descaracterizada do GCCO e ainda “subiu à parte de cima para ajudar a equipe do IML a retirar o corpo da vítima”.

A postura de Mário no local do crime foi descrita como similar a de um segurança pessoal para Cestari, disse o médico Wilson Guimaraes Novais, que esteve na casa. “O fato de o policial civil ter usado veículo oficial para se deslocar até a residência do amigo para lhe prestar solidariedade, por si só, é ilegal”, diz trecho da denúncia. Mas, além disso, “os indícios são de que o policial civil se valeu do cargo público para defender interesses privados”, acrescenta.

Por estes fatos, Patrícia também pede a instauração de inquérito policial para apurar, por completo, o auxílio prestado por Mário a Cestari.

Por fim, em relação a Fernando Oliveira, este contou em depoimento que “foi ao local por sua livre e espontânea vontade pelo fato de envolver atletas ativos da federação de tiro, tendo em vista que o declarante é o presidente da entidade”. Ele subiu à parte superior da casa para falar com o delegado e informá-lo que estava lá como presidente da federação, bem como para prestar qualquer informação necessária quanto às armas do esporte.

Após sair do condomínio, Fernando se deslocou para a delegacia para acompanhar o flagrante de Cestari, conforme dito em seu próprio depoimento. “Desse modo, é possível concluir que o policial militar Fernando permaneceu no interior da residência da família Cestari durante os trabalhos da Delegacia de Homicídios. E mais, deslocou-se até o local fardado e com viatura para, na condição de policial militar, prestar auxílio ao particular Marcelo Cestari. Isso, por si só, é ilegal”, observa a denúncia, que também pede apuração do o auxílio prestado por ele ao empresário, não somente no interior da residência, mas também perante a delegacia.
 

 
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