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Notícias / Entrevista da Semana

19/03/2023 às 08:00

A importância da defesa pessoal no combate à violência contra as mulheres

Em entrevista ao Leiagora, campeã mundial de Muay Thai, Inaleia Ferreira, fala sobre o assunto

Gabriella Arantes

A importância da defesa pessoal no combate à violência contra as mulheres

Foto: Arte: Leiagora / Foto: Arquivo pessoal

A importância da defesa pessoal no combate à violência contra as mulheres é o tema da entrevista desta semana do Leiagora. Quem fala sobre o assunto é a campeã mundial de Muay Thai, Inaleia Ferreira, de 43 anos.

A  atleta explica sobre os benefícios de aprender a lutar e como a mulher se transforma depois de começar. Inaleia também convidou para o aulão gratuito de defesa pessoal que acontecerá no próximo sábado (25), no Parque das Águas em Cuiabá. 

Confira a entrevista na íntegra:

Leiagora -  Qual a importância de aprender defesa pessoal?

Inaleia - Eu 'tô aqui abismada e chateada com o caso do ex-namorado que esfaqueou essa menina no meio da rua. Numa situação daquela aí é imprescindível a pessoa saber se defender. Salva vidas, você saber se defender é isso, não tem outra dinâmica. É igual arma de fogo, só um exemplo. É melhor você ter e usar do que precisar usar e não ter. A arte marcial é uma arma de fogo ambulante, porque nós somos uma arma ambulante. Eu tenho um cotovelo que é uma arma se eu usar no momento certo. Se eu chutar é uma arma, se eu der um chute frontal no queixo de uma pessoa é uma arma, se eu der um murro em uma pessoa é uma arma e seu mobilizar é uma arma. Então é melhor eu saber e não precisar usar, do que precisar usar e não ter. 

Leiagora - Você acredita que as mulheres ficam mais confiantes quando aprendem a se defender?

Inaleia - Com certeza. A postura muda e o psicológico também. A primeira coisa que muda na gente é o psicológico. Já aconteceu relatos de alunas minhas “professora um cara veio falar grosso comigo e eu olhei para ele, falei olha aqui”. Ela disse que não tinha essa postura antes de aprender muay thai ou antes de começar a fazer arte marcial. Nós começamos a produzir endorfina, que é hormônio da confiança. Então quando você aprende e começa a praticar um esporte de contato físico, você com certeza muda sua postura, seu comportamento e você começa a acreditar que é capaz de merecer mais. E eu falo para as meninas todos os dias se olharem no espelho e se amarem como são. Falem para vocês merecem mais, ser amadas, protegidas, entendidas e compreendidas. Não julgadas, violentadas e agredidas.

Leiagora  - Terá um aulão gratuito de defesa pessoal no próximo sábado (25)? 

Inaleia -  É um evento muito importante, o tema é a violência contra a mulher. Nós vamos estar com um paredão de mulheres maravilhosas dando palestras lá. Elis Regina Prates, Vera Wender, Cely Almeida, Major Raíssa, Tassia Poit, Gisela Simona, Natasha slhessarenko e Diela Taba Nhaq
. Cada um dando um tema diferente. Porque  é fácil falar que a mulher agredida não faz alguma coisa, porque ela não vai embora ou quebra esse ciclo? Mas não é bem assim. O agressor vai no fundo do seu psicológico, ele faz acreditar que você merece passar por aquilo, que você não é nada sem ele e que é ruim com ele e pior sem ele. Tem uma frase que todos falam "melhor aguentar”. No evento vamos falar de vários temas e um deles é a prisão psicológica. O nome do evento é “Mulher Não Se Bate, Se Cuida”. Não vamos nos unir para falar dos homens, e sim de um tema muito importante que a sociedade precisa entender que nós estamos correndo risco. A cada minuto, a cada segundo uma mulher está sendo agredida e o responsável por isso é o pai, a mãe, o vizinho, o tio, todo mundo é responsável por isso. Nós temos que cuidar das nossas meninas. Como? Observando a pessoa que convive com essa menina. Todo agressor tem característica de agressor. Então tudo isso nós vamos estar falando nesse tema durante o evento. A cada 10 minutos terá um tema importante e é para mulheres, família inteira, sociedade, é para o seu chefe e todo mundo. 

Leiagora  - Que horas vai começar o evento? Onde será?

Inaleia - Vai começar às 17h lá no Parque das Águas. Será dia 25 de março, próximo domingo. Vamos estar com o Instituto Millenium, através da doutora Tásia falando sobre a autoestima da mulher, para mulher se cuidar e se amar do jeito que ela é. Se alguém falar que ela não tá bem, que está feia, que está gorda, velha, muito magra, isso não pode. Você tem que se amar do jeito que é, cuida de você para depois cuidar das pessoas. Terá um aulão comigo lá também, que é a melhor parte do evento. O aulão será dividido em duas partes, a primeira parte estaremos fazendo aquecimento e alongamento, mostrando que o Muay Thai é qualidade de vida. Não é violência, é um esporte riquíssimo de oportunidade para você ter um fortalecimento, criar massa magra e ter um condicionamento físico. Dá para emagrecer com o Muay Thai, tudo isso aliado comigo e com todas as academias de Cuiabá vão estar por lá, mostrando e puxando o aulão para todo mundo ter a oportunidade de dar um chute em alguém. No segundo plano do aulão terá as palestras. A major Raissa estará lá com a gente falando sobre as estatísticas da violência. Depois eu volto mostrando que o Muay Thai pode salvar a sua vida. Eu posso usar ele como defesa pessoal sim, não posso usar para brigar na rua. Mas para defender do agressor tem vários golpes que eu posso usar como defesa social. 

Leiagora - O que significa ser uma mulher lutadora em Mato Grosso? Você tem desafios? Enfrenta preconceitos? Quais?

Inaleia - Todos os desafios do mundo e todos os preconceitos do mundo. Eu uso todos eles como degrau de escada. Em todo lugar temos desafios. Agredido que na sua você tem também por ser menina, pela profissão que escolheu. E nós mulheres, todos os desafios que temos, somos capazes de superar. A partir do momento que quero aquilo, que eu acredito no meu potencial, que aquilo é o melhor pra mim, que vou ser feliz fazendo aquilo, eu vou conseguir superar todos. Tem algumas mulheres que são sexo frágil, e esse é mais um motivo para o homem cuidar da gente. Por que nos agredir? Para que bater na gente? Por que não dar amor e carinho? Por que não cuidar desse sexo frágil? 

Mas nós temos as mulheres que quebraram barreiras. O esporte é 100% masculino, até porque é um esporte de guerra. Os homens vão para guerra, eles saem para caça. Mas hoje as mulheres também saem para caça, também vão para a guerra. Então por isso nós sofremos preconceito. é esporte masculino mas nós também podemos participar porque somos capazes. Eu sofro preconceito sim, hoje em Mato Grosso a única mulher que tem os títulos que tenho. Hoje, eu tenho minha própria academia, além de ser atleta eu coordeno um grupo de atletas que eu tenho, sou treinadora hoje. Nós estamos se apressando nos eventos e temos ganhado 99% deles. Mais um motivo para eu ter certeza que estou no caminho certo. Mas se eu quiser ser o sexo frágil em algum momento na min ha vida? E se eu tiver TPM? E se eu quiser chorar? Também posso, né? 

Leiagora - Da onde veio essa vontade de lutar?

Inaleia -  Cara, essa Inaleia de hoje sempre existiu, só que ela estava escondida num casamento abusivo e cuidando da vida de outras pessoas. Houve um momento em que eu sofri um acidente e precisei cuidar de mim. Eu deixei de cuidar de mim para cuidar da minha família, dos vizinhos e amigos. Mas isso é egoísmo? Não. Como eu vou cuidar das outras pessoas se eu não estou bem, isso é reciprocidade. Então infelizmente a mulher começa a cuidar de todo mundo e esquece dela. Eu sofri um acidente e descobri o quanto estava me deixando em quinto plano, eu não era prioridade pra mim. Eu descobri que sempre gostei do esporte desde quando assisti as lutas do Mike Tyson lá em 1996. E que eu já era lutadora e só precisava subir no ringue. Quando eu descobri o muay thai comecei a lutar para emagrecer porque eu pesava 110 quilos. E aí comecei a emagrecer, me apaixonei e disse que quero lutar. Aí, vem as vozes “para com isso, é loucura, esse esporte é de homem e você já está velha”. Porque eu comecei tudo isso com 36 anos, então assim todo mundo está se aposentando com essa idade e eu estava começando. Eu renasci naquele momento. Mas aí vem os conhecidos falando para eu parar com isso. Todo mundo foi contra mim naquele momento, menos a minha filha. Ela foi a única que ficou ao meu lado. Meus pais, meu marido, tudo ficou contra. Meu ex-marido me expulsou de casa por causa do esporte. Mesmo dizendo que eu não era capaz e, hoje eu sou bicampeã nacional, tricampeã estadual, vice campeã nacional na tailândia em 2018, campeã mundial na tailândia em 2019 e vice campeã mundial na Europa em 2023. 

Leiagora - Você acha que o esporte é pouco valorizado em Mato Grosso?

Inaleia - Nós não temos apoio do governo. O governo não reconhece os atletas como representantes do estado. É um ou outro esporte que o Estado apoia, porque são esportes olímpicos e o muay thai ainda não é oficialmente. Então, nós temos essa dificuldade do apoio do governo, mas não precisa não.  Não que é apoiar, ótimo. Será 100% dos nossos problemas resolvidos financeiramente. Mas quando não recebemos esse apoio a gente move os amigos e os que acreditam na gente. A gente faz as pessoas entenderem que a gente precisa de apoio de uma palavra, comportar uma camiseta, dar uma abraço ou fazer uma oração para a gente. Através dessas dificuldades a gente move as pessoas. Tem pessoas que não têm coragem de entrar no ringue e trocar porrada, mas me apoiam, porque queria ter a minha coragem. Os meus patrocinadores me apoiam por isso.
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